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Julia Röcker - estagiária do Núcleo Evoluir

            O câncer é uma doença em que ocorre o crescimento desordenado do número de células que podem concentrar-se em uma ou mais regiões. Existem mais de 100 tipos de câncer, variando conforme o tipo de célula e região atacada. Essa doença não se restringe a uma faixa etária específica, podendo atingir crianças, adultos e também idosos.

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), uma maneira de prevenir a ocorrência do câncer é evitar os fatores de risco (alimentação ruim, fumar, peso corporal acima do adequado, falta de atividade física, ingestão de álcool, consumo de carne processada, exposição ao sol sem proteção e a agentes cancerígenos no trabalho) e desenvolver um estilo de vida saudável, mantendo os exames preventivos e a vacinação em dia. Atualmente, no entanto, nem sempre é possível optar por um estilo de vida saudável, pois os hábitos cotidianos do indivíduo são atravessados por sua condição econômica e também por condições relacionadas ao seu trabalho. Por exemplo: se uma pessoa possui um turno de trabalho de 12 horas diárias, não consumir carne processada, praticar exercícios físicos e manter uma alimentação saudável pode ser um grande desafio. Além disso, é imprescindível destacar que, em território nacional, muitos agrotóxicos são utilizados no cultivo de alimentos e também ocorre o amplo uso de antibióticos na criação de animais.

Sabe-se que o tratamento para o câncer inclui a necessidade de submeter o paciente a exames e outros procedimentos dolorosos, que utilizam medicamentos com muitos efeitos colaterais desagradáveis. Além disso, pode-se dizer também que o diagnóstico de câncer é uma etapa difícil, e pode trazer, além do sofrimento físico do indivíduo, sofrimento psicológico intenso dos pacientes e de seus familiares ou cuidadores. Segundo Motta e Enumo (2002), fatores como o ambiente e a rotina hospitalar, ausência da família, e a agressividade do tratamento e também sua longa duração podem constituir um contexto muito aversivo para o paciente portador de câncer, dificultando o enfrentamento dessa fase tão difícil.

Diante das dificuldades mencionadas, a família se configura como uma rede de suporte indispensável para o paciente, uma vez que os familiares podem auxiliar o indivíduo a lidar melhor com os fatores estressantes do tratamento do câncer (Tavares e Trad, 2010). Além disso, a dinâmica familiar também irá se modificar conforme as fases do tratamento (diagnóstico, fase crônica e fase terminal) de maneira a melhor atender as demandas do indivíduo portador de câncer. Cada fase possuirá seu foco: durante o diagnóstico, a família se organiza de forma a atender as necessidades imediatas do indivíduo com câncer, e trabalhar o recebimento desse diagnóstico; na fase crônica, são trabalhados os processos de aderência ao tratamento e também de convivência com suas implicações; e caso haja fase terminal, a família se organizará de forma a pensar questões como a finitude da vida, e a desenvolver cuidados paliativos para com o indivíduo (Tavares e Trad, 2010). Nesse sentido, é inevitável citar a psicoterapia como forma de auxiliar o indivíduo e sua família a enfrentar todos os processos envolvidos no descobrimento e tratamento do câncer.

            É importante destacar que atualmente o avanço das tecnologias e da medicina permitiu que seja possível curar muitos tipos de câncer, e essa chance aumenta se a doença for descoberta em seus estágios iniciais. Além disso, o afeto, carinho e apoio da família são peças-chave para auxiliar o indivíduo a percorrer o caminho até a cura. Portanto, neste Dia Nacional do Combate ao Câncer, é uma missão de todos se envolver nas campanhas de vacinação, de exames preventivos e de conscientização sobre o câncer, bem como desenvolver o hábito saudável de visitar um médico regularmente.

Referências:

MOTTA, Alessandra Brunoro; ENUMO, Sônia Regina Fiorim. Brincar no hospital: câncer infantil e avaliação doenfrentamento da hospitalização. Psicologia, saúde & doenças, v. 3, n. 1, p. 23-41, 2002.

TAVARES, Jeane Saskya Campos; TRAD, Leny Alves Bomfim. Estratégias de enfrentamento do câncer de mama: um estudo de caso com famílias de mulheres mastectomizadas. Ciência & Saúde Coletiva, v. 15, p. 1349-1358, 2010.

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Apesar dos avanços na legislação de proteção à mulher, a cada quatro minutos uma mulher é agredida no Brasil. O Dia Internacional do Combate à Violência Contra a Mulher é celebrado anualmente no dia 25 de novembro com o objetivo de voltar a nossa atenção para essa questão que está longe de ser resolvida.

O Mapa da Violência aponta que o Brasil é o quinto país onde mais se mata mulheres, atrás apenas de países como a Rússia, Guatemala, El Salvador e Colômbia. O mesmo levantamento traz também que o feminicídio no Brasil é 48 vezes maior do que no Reino Unido, por exemplo. Tendo em vista a subnotificação da violência de gênero, acredita-se ainda que este número seja muito maior, visto que muitas mulheres não denunciam casos de agressão e estupro, e que muitos dos crimes de feminicídios não são classificados como tal.

Os dados mostram que a criminalização da violência contra a mulher não basta: a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada em agosto de 2006 com o objetivo de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Mais tarde, em 2015, foi aprovada a Lei do Feminicídio (13.104), categorizando o assassinato de mulheres como crime hediondo e estabelecendo penas mais duras para esse ato. O Mapa da Violência mostra, entretanto, que as leis não alcançaram seu objetivo, visto que a taxa de homicídio dessa população segue aumentando: enquanto em 2007 a taxa era de 3,9, em 2015 passou para 4,8.

A condição de desigualdade social das mulheres com relação aos homens é observada em todas as culturas do mundo: não só diferenças biológicas separam homens e mulheres, mas sim a dominação de um gênero sobre o outro, a partir da concepção de que o feminino é inferior ao masculino. Nesse sentido, a violência contra as mulheres é fruto de um funcionamento social marcado pela dominação masculina, o patriarcado, que está na base das representações de gênero que legitimam a desigualdade internalizada por homens e mulheres, assegurando aos homens que perpetuem sua supremacia inclusive por meio de violência. Por esse motivo, ao compreender a dominação masculina como algo natural, muitas mulheres permanecem em relações abusivas e não conseguem romper com a situação de opressão a que estão submetidas. Entender a violência contra a mulher como fruto do modelo patriarcal faz ainda mais sentido quando verificamos que, em cerca de 60% dos casos, a agressão ocorre no ambiente familiar, e grande parte das vezes é cometida pelo próprio parceiro amoroso da vítima.

Além disso, a agressão pode não ser só um tapa: apesar da violência física ser a mais evidente, as mulheres estão submetidas a diferentes tipos de agressão, como a psicológica e sexual. A violência psicológica pode ser de difícil detecção, mas traz prejuízos tão grandes ou ainda maiores que a agressão física, e pode ser manifestada por meio de abuso verbal, intimidação, ameaças, desprezo, controle econômico, etc. Por ser mais sutil, é comum que muitas mulheres não reconheçam que estão passando por uma situação de abuso, o que faz com que elas permaneçam em relações violentas.

Em 2018, foram registrados 66 mil estupros no Brasil, o que corresponde a cerca de 180 casos por dia - destes, em 82% das ocorrências, as vítimas eram mulheres. Há ainda que se considerar que este é um crime de baixa notificação, já que muitas das vítimas se negam a registrar o boletim em decorrência de um sentimento de culpa, com medo de serem desacreditadas, de possíveis retaliações, discriminação, humilhação e preconceito. Segundo o Datafolha, 33% da população acredita que a mulher seja culpada pelo estupro. Imagina-se que o número real de casos seja muito maior, já que a estimativa é de que apenas 10% das ocasiões sejam informadas à polícia. Os dados apontam também que em cerca de 70% dos casos, o abusador é alguém próximo à vítima: é necessário desmistificar a imagem de que o agressor é um homem desconhecido, já que em grande parte das vezes, o estupro acontece dentro de casa.

Já o feminicídio é a forma extrema de violência de gênero que resulta na morte da mulher, sendo um qualificador do crime de homicídio. É preciso lembrar que nem todo assassinato de mulheres se caracteriza como feminicídio: para isso, é necessário que a motivação do crime seja baseada no gênero, como em situações de violência doméstica - tanto que a maior parte desses crimes são cometidos por parceiros, ex-parceiros ou pessoas da própria família da vítima. Caracterizar esses crimes como feminicídio, e não somente como homicídio, tem o objetivo de visibilizar e evitar a banalização dessa violência, fornecendo estatísticas e viabilizando a criação de políticas públicas.

 Apesar de estar presente em todas as culturas, a desigualdade de gênero e a violência contra a mulher não é um fenômeno único, e acontece de forma diferente nos variados contextos. Outro dado do Mapa da Violência mostra que a população negra é vítima prioritária da violência no país, com tendência crescente, enquanto a taxa de mortalidade entre brancas tende a cair. As grandes vítimas da violência de gênero são as mulheres pobres, jovens (entre 18 e 30 anos) e negras. Entre 2003 e 2013, o assassinato de mulheres brancas caiu 9,8%, enquanto o de mulheres negras aumentou 54,2%.

Tendo em vista os dados que apontam que os crimes de agressão física, sexual e feminicídio têm aumentado a cada ano, a despeito da criação de leis sobre isso, chegamos a uma conclusão: só a punição não é suficiente. Além da baixa notificação desses crimes, a taxa de condenação e prisão é ainda inferior: é preciso que essas leis se façam cumprir. Maior do que isso, é necessário uma mudança no funcionamento geral da sociedade que ainda acredita que a mulher merece apanhar ou ser estuprada. É preciso ensinar aos meninos, ainda jovens, a não estuprar. É preciso ensinar as mulheres a reconhecerem situações de abuso e violência para que elas se retirem assim que possível. É preciso ensinar as mulheres de que nada justifica ser violentada, estuprada ou morta: não foi culpa de sua roupa, de onde ela estava ou a hora em que estava. É preciso que todos nós saibamos acolher as mulheres vítimas de violência para que, dessa forma, os casos não deixem de ser notificados por medo do julgamento alheio. Precisamos aprender a nos posicionar frente às violências que presenciamos, e mesmo quando forem entre marido e mulher: nós meteremos a colher! Em uma sociedade machista, não ser machista não basta: devemos ser anti-machismo.

Por Bruna Senhorelli

WAISELFISZ, Júlio Jacob. Mapa da Violência 2015- homicídios de mulheres no Brasil. Brasília: Flacso Brasil, 2015. Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf

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Por Gustavo Sinhorini Menegon - estagiário do Núcleo Evoluir

            O mês de Novembro, quando o assunto  saúde pública, é marcado pela cor azul com o objetivo de reforçar a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de próstata. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA, 2019), o câncer de próstata é o segundo tipo de câncer que mais atinge homens no Brasil (atrás apenas do câncer de pele), sendo registrados em torno de 69 mil novos casos por ano. Para piorar, a incidência de câncer de pele tem aumentado significativamente nos últimos anos (GUERRA et al., 2005) e, ainda que o Novembro Azul seja uma campanha de prevenção de âmbito mundial, existe uma certa resistência por parte dos homens em realizar os exames preventivos.

            O toque retal ainda é uma das principais medidas de prevenção precoce do câncer de próstata, e isso tange muito ao que é considerado “ser homem” em nossa cultura. O fato de esse exame ser associado a práticas sexuais homoafetivas continua sendo um obstáculo para a prevenção do câncer de próstata, uma vez que exercício da masculinidade é encarado por muitos como a negação de características que são consideradas “femininas” ou quaisquer outras que fujam da ideia de “homem ideal”, viril e másculo (NASCIMENTO, 2005). Essa insegurança quanto à masculinidade está presente no relato de vários homens ao expressarem como se sentem diante da possibilidade de realizarem o toque retal, independente do grau de escolaridade (GOMES et al., 2006)

            Além disso, a influência desta “masculinidade tóxica” não é restrita à prevenção do câncer de próstata, mas se estende a todo o cuidado do homem para com sua saúde de maneira geral. A maior parte das internações em hospitais devido a doenças respiratórias, digestivas, circulatórias e infecciosas são em homens [U1] (BRASIL, 2015). Mesmo existindo programas governamentais voltados especificamente para a saúde do homem, como a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), a aderência a esses serviços de saúde ainda é baixa. Cavalcanti et al (2014) apresenta alguns fatores que contribuem para esse quadro, como a inserção da maioria dos homens no mercado de trabalho que, somada a ideia de masculinidade, impossibilita os homens de se afastarem do papel de provedor da casa para cuidar da saúde. Os autores também ressaltam que muitos homens tratam sua saúde como algo secundário ou algo que pode ser negligenciado frente as suas outras responsabilidades, bem como a própria dificuldade  em reconhecerem que têm problemas de saúde e aceitarem auxílio para tratá-los.

            O Novembro Azul, apesar de ser uma campanha de prevenção fundamental, é apenas o início do longo caminho que é promover a saúde dos homens. Falar sobre saúde do homem é falar sobre cultura de masculinidade e como isso afeta direta e indiretamente o acesso aos serviços de saúde pública e o próprio cuidado dessas pessoas consigo mesmas. Cuidar-se não deveria ser sinônimo de fraqueza, como é visto sob a ótica patriarcal tão presente na nossa cultura, mas de coragem e enfrentamento. O processo de adoecimento traz sofrimento para qualquer pessoa que passa por ele e, se o compartilhamento desse sofrimento é pouco aceito ou até punido, a dificuldade que os homens têm para olhar para sua saúde crescerá cada vez mais.

            Embora não seja fácil falar sobre masculinidade, uma vez que muitos homens se mostrarão resistentes a essa discussão, não há outro meio de reduzir as estatísticas de adoecimento e mortalidade masculina. Essa discussão deve ser feita tanto no âmbito individual quanto no coletivo para realmente transformar a noção problemática de que “ser homem” é ser invencível, invulnerável. Se conseguimos trazer um pouco desses questionamentos no mês de Novembro, porque não estender a cor azul aos outros meses do ano?    

Referências:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Dados de Morbimortalidade Masculina no Brasil. Brasília, DF, 2015.

CAVALCANTI, J. R.; Ferreira J. A.; Henriques A. H. B.; Morais G. S. N.; Trigueiro J. V. S.; Torquato I. M. B. Assistência Integral a Saúde do Homem: necessidades, obstáculos e estratégias de enfrentamento. Escola. Anna Nery Revista de Enfermagem, Rio de Janeiro, v. 18, n. 4, p. 628-634, 2014. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452014000400628&lng=en&nrm=iso>.

GOMES, Romeu et al. As arranhaduras da masculinidade: uma discussão sobre o toque retal como medida de prevenção do câncer prostático. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 13, n. 6, p. 1975-1984, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232008000600033&lng=en&nrm=iso.

GUERRA, M. R.; GALLO, C. V. M.; MENDONÇA, G. A. S. Risco de câncer no Brasil: tendências e estudos epidemiológicos mais recentes. Revista Brasileira de Cancerologia, Rio de Janeiro, v, 51, n. 3, p. 227-234, 2005. Disponível em: http://files.rachelmarins.webnode.com.br/200000020-3c6b73d65a/Risco%20de%20C%C3%A2ncer%20no%20Brasil%20-%20estudos%20epidemiol%C3%B3gicos,%202005.pdf

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER. INCA. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-prostata

NASCIMENTO, M. R. Câncer de próstata e masculinidade: motivações e barreiras para a realização do diagnóstico precoce da doença.Núcleo de Estudos de População– Unicamp, 2005. Disponível em: http://www.abesp.nepo.unicamp.br    

 

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Você já se percebeu com um leve desconforto no estômago, coração acelerado, mãos suando e tensão muscular? Dificilmente diria que não. Se essas sensações corporais estavam acompanhadas de expectativas de eventos futuros, provavelmente estava se sentindo ansioso. Muitas pessoas se identificam com esse padrão e acreditam que o dia a dia agitado tem dado um toque “especial” a sua ansiedade. Esse texto visa identificar possíveis explicações para esse fenômeno e te ajudar a responder a seguinte pergunta: porque sinto que estou cada vez mais ansioso?

O modelo atual de convivência e desempenho social está adoecendo pessoas todos os dias. A ansiedade está cada vez mais enraizada nos nossos planos de ações e nos sentimos cada vez menos capazes de controlá-la. Antes de nos aprofundarmos sobre esse tema aplicado ao nosso contexto atual, faz-se necessário percorrermos uma trajetória histórica para compreendê-lo.

Por incrível que pareça, a ansiedade tem adquirido funções adaptativas ao nosso organismo ao longo da evolução da espécie humana. Soa até inusitado compreender que essas sensações tão inoportunas podem ser funcionais ao homem. Para tentarmos analisar essa asserção, tentarei exemplificá-la fazendo você imaginar o cotidiano perigoso dos nossos ancestrais.

Ao conviver com situações instáveis e o risco de morte eminente, é essencial que o homem das cavernas esteja em constante vigilância para sobreviver e preservar sua espécie. Diante de situações perigosas, geralmente ele tem duas opções: fugir ou enfrentá-la. Logicamente, é funcional e interessante a ele que desenvolva habilidades comportamentais para lidar com situações de ameaça. Porém, nem sempre ele terá táticas suficientes para enfrentar um leão faminto, por exemplo. Imaginemos que, ao certificar-se do risco de morte que a presença do leão traz, o sistema autônomo do seu corpo é ativado. A partir de agora, seu organismo está preparado para lidar com essa situação de forma mais rápida e efetiva, considerando todas as rotas de fuga e liberando hormônios que intensificam o ritmo cardíaco, direcionam uma maior quantidade de sangue para os seus músculos e pernas – para que corra com mais eficiência, sua respiração é mais rápida e sua pressão arterial aumenta. Tudo isso é estrategicamente preparado pelo corpo para que ele fuja e sobreviva.

Supomos que, diante desse contexto, uma primeira resposta de fuga é emitida e o perigo foi evitado com sucesso. Agora, diante de uma nova situação potencialmente perigosa, podemos prever que a própria ansiedade que antecipa o medo em vivenciá-la pode se tornar condição para a emissão de um novo comportamento de fuga.  Em outras palavras, se o indivíduo está sentindo ansiedade, a tendência é que ele se esquive da situação que a gerou (Sidman, 1989/2009).

Agora que compreendemos melhor a função que a ansiedade tem adquirido ao longo da nossa história evolutiva, podemos prosseguir para analisá-la em situações cotidianas e contextualizá-la em uma condição fóbica.

Skinner (1953/2005), ao destacar o problema da ansiedade fóbica, afirmava que a própria presença da ansiedade pode nos sinalizar um estímulo aversivo e aumentar a probabilidade de respostas de fuga/esquiva, uma vez que foi estabelecida uma relação de contiguidade entre a ansiedade e o perigo. Portanto, a ansiedade pode ser aversiva o suficiente para evocar respostas de fuga/esquiva, mesmo que não saibamos, exatamente, o que estamos evitando.

Como já citado, a ansiedade “saudável”, de fato, é útil a nós. Ao funcionar como um alerta de situações que nos causam danos reais ou até mesmo como um “gás” para darmos o nosso melhor em uma prova, por exemplo – se utilizamos esta como o alvo da ansiedade –, podemos conviver com ela normalmente (Teles, 2018). Entretanto, a ansiedade a nível patológico não tem mostrado nenhuma utilidade ao nosso organismo e no nosso cotidiano. Ao contrário disso, pode interferir amplamente no funcionamento e na manutenção de comportamentos saudáveis.

Utilizemos o exemplo do estudante que faz provas acadêmicas. A imersão num contexto coercitivo lhe diz, diariamente, que ele deve estudar para ser aprovado e as conseqüências que terá caso não estude. As perdas e sanções que pode sofrer envolvem não somente a punição do comportamento inadequado por parte da escola (não estudou, nota zero!) e por parte dos pais (perda de benefícios – videogame, sair com os amigos, mesada, etc.) como também a ansiedade diante de futuras provas, a procrastinação dos estudos, sentimentos de raiva e aversão ao contexto acadêmico, evitação de assuntos relacionados, entre outros. Existem diversas variações dos subprodutos que vêm inclusos no pacote.  

Essa diversidade de efeitos colaterais evidencia o que alguns autores descrevem sobre o problema das punições severas (Sidman, 1989/2009; Skinner, 1953/2005). Ao definir o condicionamento operante, Skinner afirma que comportar-se diante de um estímulo condicionado à contingência primordial é funcional ao sujeito, pois à medida que comportamento de fuga é reforçado – por retirar estímulos aversivos do contexto, no caso do reforçamento negativo – , a probabilidade de ele ocorrer novamente é aumentada. A partir dessa concepção, é inteligível que a intenção do estudante acadêmico é afastar-se de contextos aversivos ou da possibilidade de vivenciá-los.

Ao se aprofundar nos problemas da apresentação da punição severa, Skinner também tratou da punição sem aviso prévio. Segundo o autor, um sujeito que viveu eventos aversivos “incidentais”, ou seja, sem aviso de que algo ruim estava por vir ou sem saber qual comportamento gerou tal consequência, não é capaz de distinguir os estímulos que lhe sinalizam o perigo e, geralmente, não encontra outra saída para se comportar a não ser se esquivar. Pessoas que possuem um repertório de esquiva altamente elaborado são vigilantes e constantemente pensam: “algo de errado está prestes a acontecer” (Skinner, 1953/2005).

Por mais que a ansiedade seja distinta do evento aversivo em si, Skinner (1953/2005) relata que também nos esquivamos da ansiedade. Dessa forma, comportamentos reforçados negativamente não estão somente sob controle de estímulos que sinalizam o perigo, mas também dos sentimentos que o precedem. Nesse ponto, o autor afirma que a ansiedade pode até suprimir a aprendizagem de novos comportamentos, uma vez que o sujeito vive se esquivando. A tendência da restrição excessiva é ficarmos cada vez mais vigilantes à situações "potencialmente" perigosas – aqui, devemos nos lembrar que essas situações dizem respeito a história comportamental individual de cada um – e menos sensíveis às vantagens de nos expormos a novas experiências e, possivelmente, obtermos ganhos com elas. 

Portanto, se o estudante tem que estudar para a prova acadêmic que será realizada semana que vem, há uma alta probabilidade de ele se sentir ansioso diante da quantidade de livros que tem que ler, de emitir comportamentos de procrastinação do estudo ou até mesmo de não estudar. Uma vez que o comportamento de estudar fica sob controle de contingências aversivas e não de contingências que valorizam os comportamentos adequados, a curiosidade por aprender coisas novas passa a não importar mais.

Sidman (1989/2009) tem uma posição consistente ao afirmar que o controle coercitivo é responsável pela maioria dos problemas sociais. Constantemente, nos vemos obrigados a fazer coisas para evitar sanções e isso implica dizer que nos esquivamos o tempo todo.

Do ponto de vista de Sidman (1989/2009), o controle coercitivo resulta em desajustamento social e capacidade reduzida para engajamento construtivo. A inflexibilidade diante de eventos torna-se uma característica notável de indivíduos extremamente ansiosos, marcados pela coerção excessiva e a esquiva de sentimentos aversivos. Tudo aquilo que é seguro e previsível passa a ser a sua experiência diária e sua rotina é contemplada por comportamentos estereotipados e mecânicos.

Portanto, o excesso de controle coercitivo, combinado com uma instabilidade emocional para lidar com eventos aversivos, torna o reforço positivo ainda mais valioso, à medida que o acesso a essa conseqüência vai se tornando cada vez mais difícil na vida do sujeito.

Não é novidade que a contemporaneidade, juntamente com inúmeros avanços tecnológicos, permite o fácil acesso a vários reforçadores imediatos. Um dos instrumentos que foram desenvolvidos para diminuir a taxa de respostas para obter o que queremos, que temos a nossa disposição constantemente e nos permite acesso a um número exorbitante de reforçadores é a internet.

Segundo Ewald et al. (2017), a busca de algo nas redes sociais que visa o afastamento de sentimentos desagradáveis é um fator identificado em várias pessoas que as utilizam. Isso também significa dizer que estar constantemente conectado a uma realidade paralela pode favorecer déficits de habilidades para lidar com os conflitos reais do indivíduo, que deixa em segundo plano os aspectos relevantes à manutenção das relações humanas e da própria vida. Estamos cada vez menos tolerantes a frustração e mais conectados a uma realidade que nos livra dela.

Bauman (1998) afirma que o sofrimento está intimamente relacionado ao estilo de vida na contemporaneidade. É impossível descartar o mundo em que o sujeito se constrói e o momento histórico como parte da experiência do sujeito que se comporta socialmente (Ewald et al., 2017).

Com o avanço da facilidade para se alcançar objetivos, do sucesso e do bom status social, a promoção do sentimento de inferioridade e inadequação naqueles que não alcançam esses prestígios é cada vez maior. É nesse cenário que vemos pessoas com a sensação de que não sabem lidar com os seus problemas e com o outro.

As redes sociais, por exemplo, nos possibilitam sermos quem quisermos. Não é nada difícil vermos publicações de fotos e frases que transmitem conceitos de liberdade, felicidade e qualidade de vida. Entretanto, é ali que enxergamos o conceito de liberdade paradoxal: indivíduos são “livres” para realizarem seus desejos que sempre estão condicionados ao alívio diante de tantos problemas, de uma busca por aprovação social ou até o resgate de uma felicidade perdida (Ewald et al., 2017).

A pressão social para alcançar status e sucesso tem se tornado a motivação central de várias escolhas que realizamos. A liberdade na modernidade é uma ideia camuflada de que você pode ser livre, porém, somente se alcançar a felicidade. De acordo com Ewald et al. (2017), a ansiedade tem se tornado um sintoma derivado da sensação de impotência do homem contemporâneo. Diante de tantos meios de coerção, ele acredita que não é capaz de lidar com os seus problemas, o que o faz recorrer às medidas mais rápidas para aliviar tal sofrimento.

Num contexto onde a felicidade é um dever e o desempenho é a engrenagem que move o mundo, o homem passa a se ver como uma máquina ultrapassada, um instrumento inútil perante a sociedade bem sucedida e, por mais que tente, não consegue acompanhar e cumprir as regras rígidas que lhe são estabelecidas (Ewald et al., 2017).

O sofrimento passa a ser tratado, então, isoladamente de todo o contexto histórico-social em que estamos vivendo. O cenário contemporâneo é totalmente retirado de cena e todas as possibilidades de síndromes, transtornos e deficiências são direcionadas ao indivíduo, que agora é diagnosticado e pertencente a um campo banalizado (Ewald et al., 2017).

A imposição de ideais de liberdade e felicidade acabam sendo, então, as molas propulsoras da ansiedade desenfreada na contemporaneidade. O paradoxo do tempo pós-moderno nos diz que podemos ser e ter o que quisermos, instigando o sentimento de que os seus desejos podem ser facilmente realizados (Ewald et al., 2017). Entretanto, é exigido do sujeito um ritmo frenético, a corrida pela competição e de desempenhar o melhor de si para alcançar os seus ideais, como se a felicidade estivesse no topo da montanha inalcançável e que não há mais fôlego para continuar escalando.

Atentar-se para a relação do sujeito com o seu contexto histórico-social tem se tornado cada vez mais importante e condição necessária para compreender demandas psicológicas. Estamos em constante envolvimento com a realidade que nos cerca e cada vez mais afetados, emocionalmente, pela coerção exercida por ela. A análise funcional de um comportamento deve sempre compreender o indivíduo na sua integralidade, abrangendo todas as suas experiências e os níveis de contextos que selecionam seus comportamentos para, assim, encontrarmos as raízes desencadeadoras dos sintomas.

REFERÊNCIAS

BAUMAN, Z. O mal-estar na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1998.

EWALD, A. et al. Contemporaneidade e sofrimento psíquico: Relações entre modos de vida e demandas psicoterapêuticas. Psicologia Argumento, v. 30, n. 68, p. 119–129, 2017.

SIDMAN, M. (2009). Coerção e suas implicações. (R. Azzi; Andery, M.A, Trads.) Campinas: Editora Livro Pleno. (Originalmente publicado em 1989).

SKINNER, B. F. (2005). Science and human behavior. 2 ed. Society. (Originalmente publicado em 1953).  

TELES, L. O cérebro ansioso: Aprenda a reconhecer, prevenir e tratar o maior transtorno moderno. 1 ed. São Paulo: Alaúde Editorial, 2018.

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O Dia das Crianças geralmente é sinônimo de muitos presentes, doces e festa. Apesar do apelo comercial da data, esse dia também é uma ocasião para nos atentarmos ao modo como estamos lidando com os pequenos.

Atualmente, em decorrência das transformações culturais, políticas e econômicas pelas quais a sociedade vem passando e com a exigência de jornadas de trabalho cada vez mais extensas, é comum que, para lidar com a própria culpa, alguns pais tentem compensar sua ausência com bens materiais, como brinquedos, celulares, computadores, viagens etc. No entanto, nada pode substituir a importância da presença parental na formação das crianças:  a família é a principal influência norteadora da constituição da personalidade da criança e o desenvolvimento de habilidades sociais na primeira infância está fortemente vinculado ao contexto familiar (MONDIM, 2008). O bom funcionamento familiar, a existência de vínculo afetivo, o apoio e monitoramento parental são fatores que reduzem a probabilidade de diversos problemas de comportamento no futuro, como o uso de drogas e o engajamento em atos infracionais.

Nas últimas décadas, a demanda por atendimento psicológico para crianças tem aumentado cada vez mais, e é consenso entre os psicólogos que na maioria das vezes, os problemas de comportamento das crianças têm como objetivo conseguir a atenção dos pais:  você já percebeu que, geralmente, quando a criança está brincando quietinha, isso passa despercebido, mas basta um comportamento inadequado para que os pais corram repreendê-la? A questão é: para crianças, não importa que você esteja dando uma bronca, desde que você esteja prestando atenção nela. Dessa forma, quanto menos atenção a criança está recebendo, mais frequentes e intensos serão os comportamentos-problema. Muitas vezes, basta que os pais passem a fornecer atenção e elogios aos comportamentos adequados, para que os inadequados diminuam de frequência.

Além dos efeitos sobre os comportamentos-problema, a atenção dos pais também é responsável pela construção da autoestima dos filhos: como qualquer outro sentimento, a autoestima não nasce conosco e deve ser desenvolvida durante a vida. Dessa forma, o reconhecimento que os pais expressam ao filho pelos seus comportamentos e conquistas é fundamental no desenvolvimento do amor próprio (GUILHARDI, 2002). É importante, entretanto, que os pais certifiquem-se de fazer com que a criança se sinta amada tanto nas vitórias quanto nas derrotas. 

Se tratando da educação das crianças, é comum que os pais transitem entre a repressão e a permissividade: enquanto um modelo diz respeito aos castigos corporais (beliscões, palmadas, puxões de orelha) e à retirada de algo importante para a criança (ex. ficar uma semana sem videogame), o outro refere-se à ausência de limites, e ambos têm efeitos nocivos sobre o comportamento das crianças, acarretando em prejuízos ao processo educativo dos filhos.

Como sabemos, a utilização de punição corporal na educação dos filhos é proibida desde 2014: a lei 13.010 aponta que “a criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto”. A literatura científica aponta que o maltrato é o fator de risco mais fortemente associado com o desenvolvimento de psicopatologias: o abuso e a negligência causam efeitos profundamente negativos no curso de vida da criança, podendo comprometer a cognição, linguagem, desempenho acadêmico e desenvolvimento sócio-emocional (MAIA, 2005). Sabemos também que o uso de punição, tanto corporal quanto outras formas mais brandas, acarreta em efeitos emocionais na criança (como sentimentos de raiva, medo e ansiedade), além de só suprimir o comportamento inadequado quando a pessoa punidora (o pai que exerceu a punição) está presente: isso faz com que a criança passe a fazer “arte” escondida e a mentir para os pais.  Além disso, ao se utilizar da punição, estamos fornecendo um modelo de agressividade para as crianças, que aprendem grande parte de seu repertório por imitação, e tendem a repetir os atos agressivos.              

A ausência de punição, no entanto, não é sinônimo de permissividade: para ensinar aos filhos o que é correto, devemos estabelecer e explicitar limites, sermos claros e consistentes e garantir que os limites sejam respeitados, elogiando, dando atenção e afeto aos filhos quando seguirem as regras estabelecidas. Alguns pais podem imaginar que as crianças se sentem amadas quando podem fazer o que querem: no entanto, elas precisam de limites saudáveis e razoáveis, e a preocupação e supervisão dos pais é o que faz com que elas se sintam amadas.

Se você, por diversos motivos, não pode passar grandes quantidades de tempo com seu filho, invista na QUALIDADE do tempo que passa com ele: demonstre interesse, ouça atentamente as suas histórias, se esforce para compreender seus problemas. Compensar a ausência com presentes pode fazer com que a criança supervalorize as coisas materiais em detrimento dos momentos preciosos com quem se ama, e que pense que o dinheiro pode comprar tudo. Nesse dia das crianças, tudo bem presentear seu filho com um carrinho, uma boneca ou um xbox, mas não se esqueça de que o presente deve ser acompanhado por um caloroso abraço e um “eu te amo”.

 

Referências:

Mondin, E. M. C. (2008). Práticas educativas parentais e seus efeitos na criação dos filhos. Psicologia Argumento, 26 (54), 233-244.

Canaan, S., Neves, M. E., Silva, F., & Rober, A. (2002) Compreendendo seu filho: uma análise do comportamento da criança. Belém: Paka-Tatu.

Guilhardi, H. J. (2002). Auto-estima, autoconfiança e responsabilidade. In M. Z. S. Brandão et al. Comportamento humano: tudo ou quase tudo que você queria saber para viver melhor. Santo André: Editora Esetec. 63-98

Maia, J. M. D., & Williams, L. C. A, (2005). Fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil: Uma revisão da área. Temas em Psicologia, 13(2), 91– 103.

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No dia 10 de outubro é comemorado o Dia da Saúde Mental. Segundo a Organização Mundial da Saúde (2000), a saúde seria um compilado de bem-estar físico, mental e social, e não se resume apenas à ausência de doenças (Souza, Baptista e Baptista, 2010). Dessa maneira, entende-se que a saúde mental é uma “fatia” do que se pode considerar saúde e diz respeito à capacidade do indivíduo de desenvolver relacionamentos interpessoais, se engajar em atividades, raciocinar, e também cuidar de si. Visto isso, não estar doente não é o único requisito a cumprir para possuir uma boa saúde mental.

Sabe-se que muitos fatores da vida cotidiana podem influenciar na saúde mental, como, por exemplo: as condições sociais e econômicas, os relacionamentos interpessoais, o trabalho e a rotina de atividades. Além disso, vale destacar que possuir relacionamentos e atividades que proporcionem prazer e bem-estar podem auxiliar o indivíduo a ter uma saúde mental elevada (SOUZA, BAPTISTA e BAPTISTA, 2010). Segundo Souza, Baptista e Baptista (2010), uma rede de apoio social bem constituída pode ser um fator de proteção para transtornos mentais comuns (TMC), uma vez que auxilia o indivíduo a manejar situações adversas ou inesperadas. Assim, o indivíduo pode adaptar-se às demandas de seu contexto, e lidar melhor com seus sentimentos.

Outro fator importante para cuidar da saúde mental é a autoestima. Segundo Guilhardi (2002), a autoestima “é o produto de contingências de reforçamento positivo de origem social”, ou seja: ninguém nasce com uma boa autoestima, ela é construída ao longo da vida. Com isso em vista, relacionamentos sociais e uma rede de apoio que valorizem as ações e os comportamentos de um indivíduo são essenciais para a construção de uma boa autoestima, e a autoestima é indispensável para que uma pessoa consiga sentir-se útil, amada e importante. Todos esses sentimentos, em conjunto, possuem um forte impacto na saúde mental, uma vez que podem fazer com que as pessoas sintam que possuem “motivos para continuar”.

Os “motivos para continuar” são fruto de relações e atividades que promovam o prazer e o bem-estar (em uma linguagem analítico-comportamental, pode-se dizer que são fruto de contingências que produzam reforçadores). Portanto, é de extrema importância que um indivíduo não preencha todo seu tempo com atividades que geram muito stress e ansiedade, mas saiba balancear e dividir seu tempo com atividades que o façam sentir feliz, satisfeito e importante, como sair com os amigos, ficar com a família, praticar um hobbie, praticar esportes, etc.

Uma possibilidade para cuidar da saúde mental é investir em psicoterapia, uma vez ela pode auxiliar o cliente a compreender quais são suas fontes de reforçadores, lidar com sentimentos e situações desagradáveis, desenvolver comportamentos úteis para a resolução de problemas, autoestima, autoconhecimento e autoconfiança. A psicóloga Paula Cordeiro ressalta a importância da autonomia individual para a construção de valores que façam sentido tomando como base a vivência do indivíduo. Essa autonomia individual está profundamente relacionada ao autoconhecimento que pode ser desenvolvido na psicoterapia. Segundo Zilio (2011), os valores de um sujeito servirão como base para que seus objetivos sejam definidos, e orientarão seus comportamentos com vistas a atingir esses objetivos. Desta maneira, os valores podem constituir um ponto crucial para conservar uma boa saúde mental – se forem definidos objetivos saudáveis e reforçadores para aquele indivíduo.

Por fim, vale lembrar que não existe uma receita ou uma fórmula secreta para cultivar uma boa saúde mental! Cada indivíduo é único, portanto, cada um deve explorar as possibilidades para descobrir quais atividades são reforçadoras para si.

Referências

DE SOUZA, Mayra Silva; BAPTISTA, Adriana Said Daher; BAPTISTA, Makilim Nunes. Relação entre suporte familiar, saúde mental e comportamentos de risco em estudantes universitários. Acta colombiana de Psicologia, v. 13, n. 1, p. 143-154, 2010.

GUILHARDI, Hélio José. Auto-estima, autoconfiança e responsabilidade. Comportamento humano: tudo (ou quase tudo) que você precisa saber para viver melhor, p. 63-98, 2002.

Organização Mundial de Saúde (OMS) (2000). Conselho Executivo – 107º sessão. Recuperado em 21 mar. 2005: www. saudemental.med.br/OMS.htm.

ZILIO, Diego. Algumas considerações sobre a terapia de aceitação e compromisso (ACT) e o problema dos valores. Perspectivas em análise do comportamento, v. 2, n. 2, p. 159-165, 2011.

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As mudanças nos relacionamentos entre casais ao longo dos anos afetam também a vida sexual. Para debater esse tema e ajudar as pessoas a entenderem melhor as mudanças no desejo em relacionamentos longos, o Núcleo Evoluir promove no dia 5 de outubro o evento “A vida sexual em relacionamentos longos: compreender as mudanças para aproveitar - muito! - a vida sexual do casal!”. O encontro será mediado pela médica ginecologista Rebeca Gerhardt e pela psicóloga Paula Cordeiro, mestre em análise de comportamento. A palestra será das 8h30 às 12 horas, no auditório do edifício Torre Montello (av Ayrton Senna da Silva, 550). Informações e inscrições: (43) 3324-4741 ou whatsapp (43) 9 9813-2619. 

“A motivação para fazermos o evento surgiu dos atendimentos. As mudanças no desejo sexual são comuns, como são normais as mudanças em outros aspectos do relacionamento. Entender estas transformações é o caminho para trazer mais equilíbrio à vida a dois, inclusive no sexo”, pontua Paula. 

Segundo ela, quem não se atenta às mudanças pode entrar em sofrimento e até colocar o relacionamento em risco. “Por isso é importante conversar. No evento, vamos convidar o público a participar da conversa, pois não existem soluções únicas, é preciso explorar e descobrir o que funciona em cada fase”, diz. 

A psicóloga lembra que sexo não se resume ao ato específico, mas envolve também intimidade, companheirismo e afetividade. “Nosso objetivo é ajudar os participantes a descobrirem o que gostam no momento. Se o relacionamento muda, por que a vida sexual não iria mudar?”, questiona. 

O encontro é aberto a casais de diferentes orientações sexuais e também participantes individuais em busca de autoconhecimento. 

Serviço

“A vida sexual em relacionamentos longos: compreender as mudanças para aproveitar - muito! - a vida sexual do casal!”

Com Rebeca Gerhardt e Paula Cordeiro

Data: 5 de outubro

Horário: 8h30 às 12 horas

Local: auditório do edifício Torre Montello (av Ayrton Senna da Silva, 550)

Investimento: R$ 65,00 (individual) ou R$ 120,00 (casais ou duplas)

 Informações e inscrições: (43) 3324-4741 ou whatsapp (43) 9 9813-2629. 

 
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Por Bruna Senhorelli, estagiária do Núcleo Evoluir

Apesar de se fazerem presentes na sociedade desde sempre, por muito tempo as pessoas portadoras de deficiência foram consideradas como uma abominação ou um castigo divino, sendo segregados em hospitais, marginalizados e excluídos. Foi só no século XIX que essa população passou a ter atenção e cuidado especializado, período que coincide com um grande avanço na medicina, o que permitiu a melhoria na saúde e qualidade de vida desse público. No entanto, até hoje a falta de conhecimento da sociedade em geral faz com que haja um estigma em torno da deficiência, reduzindo o sujeito à sua limitação e enxergando-o como incapaz.

No Brasil, a partir da Constituição de 1988, algumas mudanças significativas foram realizadas nesse cenário: entre os direitos alcançados nessa época, estão a reserva de vagas em concursos públicos, cotas em empresas privadas e as diretrizes para a educação inclusiva. Segundo a Lei Nº 13.146/15, conhecida como Lei da Inclusão, a pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. A legislação, apesar de ser um passo importante, não garante que tais direitos estejam sendo cumpridos de fato: é preciso lutar diariamente pela implementação e fiscalização de tais políticas.

Apesar da lei exigir que empresas com cem ou mais funcionários destinem de 2% a 5% de suas vagas a pessoas com deficiência, ainda falta muito para que essa população tenha plena inserção no mercado de trabalho. O número de vagas reservadas, mesmo sendo irrisório, é frequentemente descumprido pelas empresas. Dados do IBGE de 2010 apontam que 45,6 milhões de brasileiros declararam ter alguma deficiência, representando cerca de 23% da população. Entre elas, se enquadram deficiência visual, auditiva, intelectual, física e múltipla. Será que essa grande parcela da população está sendo incluída de fato?

No âmbito da educação, faz-se claro que a determinação legal não basta para que a inclusão seja realizada com qualidade: apesar do aumento expressivo de crianças com deficiência matriculadas na rede regular de ensino, alguns dados apontam que as práticas educativas têm surtido pouco efeito na aprendizagem desses alunos. Um fator que contribui para o insucesso da inclusão escolar é o fato de que as políticas delegaram ao professor a responsabilidade de estabelecer as condições necessárias para a escolarização desses alunos, apesar desses profissionais relatarem uma falta de conhecimento sobre as deficiências e em como lidar com esse público. Nesse sentido, é necessário que haja a capacitação dos profissionais que entrarão em contato com essa população, além de uma conscientização da sociedade em geral.

Apesar dos avanços consideráveis, ainda há muito que se fazer para promover a plena inclusão da pessoa com deficiência. É preciso se atentar ao fato de que eliminar somente as barreiras físicas não é suficiente: além das arquitetônicas, existem barreiras “invisíveis”, comunicacionais, sociais e atitudicionais que prejudicam o direito da pessoa com deficiência de se locomover, se relacionar e exercer sua cidadania. A acessibilidade, muito mais do que adaptar ambientes, diz respeito à construção de uma sociedade mais igualitária através da garantia de direitos e do respeito. Nesse Dia de Luta da Pessoa com Deficiência, há muito para se comemorar, mas também é importante nos atentarmos para as barreiras que ainda precisam ser quebradas, e principalmente ao que cada um pode fazer individualmente para contribuir com um país justo e igualitário para todos.

MACIEL, M. R. C. Portadores de deficiência: a questão da inclusão social. 14 (2). São Paulo em Perspectiva, 2000.

DICHER, M; TREVISAM, E. A jornada histórica da pessoa com deficiência: inclusão como exercício de direito à dignidade da pessoa humana.

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O número de suicídios registrados vem crescendo assustadoramente no País. Segundo informações da campanha Setembro Amarelo acontecem cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de 1 milhão no mundo. Profissionais se debruçam tentando entender ou mapear gatilhos e causas. A partir dessas tentativas nasceu a campanha Setembro Amarelo: um mês de conscientização e prevenção ao suicídio. A iniciativa cumpriu um papel de imenso valor tirando o tema de um lugar escuro de falta de informações e vergonha e trazendo para a discussão de toda a sociedade.

No entanto, muito pouco se fala sobre o suicídio entre crianças e adolescentes. “Difícil imaginar que os pequenos e jovens adultos possam ser tomados por tamanha tristeza e desesperança a ponto de terminar com a própria vida. Mas isso acontece”, destaca a psicóloga Paula Cordeiro, do Núcleo Evoluir em Londrina. É importante, acrescenta ela, que se tenha entendimento da relação da nossa cultura com esse sofrimento crescente e, em consequência, o número de (tentativas) suicídio. Hoje, lamenta a psicóloga, temos uma cultura exigente e ao mesmo tempo negligente. “Queremos performance, estudos, sucesso, exigimos o máximo das nossas crianças e adolescentes. Eles fazem inglês, natação, judô, balé, aula de dança, reforço na escola, Kumon, entre inúmeras outras atividades. O fantasma do vestibular chega cedo. A pressão por um lugar ao sol no mundo dos adultos também”, exemplifica.

Ao mesmo tempo, lembra Paula, nossa sociedade não abre espaço para que as crianças, adolescentes e mesmo adultos falem sobre sentimentos. Muitas vezes, “pede-se” para as crianças pararem de chorar ou rotulam que os adolescentes são dramáticos. Na avaliação dela, está faltando um pouco de tempo, empatia e conhecimento para acolher os sentimentos das crianças e adolescentes. E assim desenha-se uma panela de pressão: exigências de todos os lados e nenhuma porta para correr.

Dessa forma, tem início as dificuldades e sofrimentos emocionais desse público tão jovem: ansiedade, tristeza profunda, quadros depressivos, transtornos alimentares, dificuldade de foco, entre outros. E por outro lado, pontua a psicóloga, a sociedade apresenta soluções nada adequadas: uso de drogas (lícitas ou não), desenhos, séries e filmes que são usados como recompensas e calmantes, jogos online, comidas gostosas. “Inúmeras alternativas pra não pensarmos na dor. Pra não lidarmos com tristezas, frustrações, ansiedades e outros sentimentos.”, pondera Paula. E às vezes, diz ela, se chega à ultima fuga: o suicídio. “O suicídio, na maior parte do tempo não é sobre morrer, é sobre acabar com uma dor, com um sofrimento muito grande”.

Paula observa que não existe uma fórmula “simples”. “Não há um plano de fuga. Não existe uma receita pronta. Existe, sim, uma mudança de cultura. Uma tentativa de seguir por um caminho em que haja interação. Interesse real na criança, no adolescente, em seus problemas, em suas vitórias. É mais difícil do que parece. Exige tempo (vale mais que ouro hoje em dia), paciência e empatia”, sugere.

A solução não vem na bula do remédio, reforça a psicóloga, está em promover nos adultos, para que esses ajudem as crianças e adolescentes, uma vida com propósitos, valores e aceitação. “Nada disso é simples. Mas é preciso tentar e de forma urgente.”

Paula ressalta que não é o caso de se falar nos "5 sinais de que seu filho está em perigo", mas deixa um pedido aos pais e cuidadores:  “Conversem com seus filhos, escutem o que eles têm pra dizer (de forma real, presente e sem tempo contado). Ensine-os a acolher os sentimentos, diga que às vezes ficamos tristes e frustrados. Ajude-os a encontrar valores, propósitos de vida (não é uma profissão, ou uma meta de classe social, mas sobre como é a pessoa que ele quer se tornar). Passem tempo juntos, de qualidade, entendam que eles sentem dor e que não é drama”. As respostas, garante a psicóloga, não são simples, mas são mais acessíveis.

Além disso, Paula recomenda que em qualquer momento que sentirem necessidade é para procurar ajuda. “Psicoterapia pode ajudar nessas mudanças e novos caminhos. Assim cuidamos de nossas crianças, de nossos adolescentes e do nosso futuro.”

 
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Comer é um ato inevitável. Comer é inerente à vida, visto que quem não o faz, falece, seja humano, cachorro, tamanduá, ipê amarelo, cogumelo e até bactéria. É o consumo de nutrientes que fornece energia para um organismo se manter vivo e, dentro de um ponto de vista fisiológico, isso até poderia servir como uma definição para o ato de comer. “Na natureza nada se cria, tudo se transforma” é uma frase muito adequada para resumir esse processo biológico – um organismo vivo transforma os nutrientes que consome na energia que o mantém vivo e, em algum momento, precisará comer novamente para continuar vivendo.

Entretanto conseguir esses nutrientes não é tão simples. Comportar-se é fundamental para se alimentar e, dentro disso, existem uma gama de comportamentos que podem ser elencados com esse objetivo: movimentar-se até o alimento, lutar contra ele, agarrá-lo do alto de uma árvore ou ir até o supermercado mais próximo e abrir um pacotinho da batata chips. Visto que isso pode ser muito custoso, porém essencial, o comportamento de se alimentar controla gigantesca parte da vida dos organismos, principalmente da espécie humana.

Basta olhar para a nossa História: deixamos de caçar e coletar para plantar e domesticar animais há mais de 10 mil anos, cruzamos continentes e oceanos por especiarias séculos atrás e hoje inventamos inúmeras maneiras de tornar nossa alimentação mais fácil e prática, ainda que isso custe nossa saúde e, talvez, nosso planeta. A desnutrição, que sempre foi constante em nossa civilização, atualmente divide espaço com a obesidade e outras doenças crônicas provocadas pelo alto consumo de gorduras não saudáveis, açúcares refinados e conservantes.

Diante disso, ainda é possível dizer que comer é somente consumir nutrientes? O que consumimos aqui no Brasil costuma ser completamente diferente do que pessoas na Índia, em Honduras ou em Madagascar consomem e isso tem um porquê – comer é um ato social. Depende da nossa cultura, da nossa geografia, da nossa história. Esses aspectos abrangem tanto o acesso que temos aos alimentos, como os preparamos e como os consumimos (que atire a primeira pedra o(a) brasileiro(a) que nunca teve dificuldade de comer com hashis). 

Além de tudo, comer é um comportamento mantido não só por saciar a fome, mas também pelo prazer que proporciona. São descargas de dopamina e serotonina, substâncias do nosso cérebro responsáveis pelas sensações prazerosas, modeladas pelo contato que temos com a comida ao longo de nossa vida. Não é mistério o porquê sua avó prefere doce de abóbora enquanto você gosta mais de chocolate, ou vice-versa.

Vale ressaltar também a importância da ingestão de nutrientes para além da produção de energia para o corpo. Eles são primordiais para a produção de neurotransmissores que, em déficit ou excesso, podem contribuir para o desenvolvimento de transtornos psicológicos como depressão e ansiedade. Um corpo que não recebe os nutrientes necessários muito provavelmente irá passar por algum nível de sofrimento físico e/ou psíquico.

Defronte a esse cenário complexo e multifacetado, a atuação do nutricionista é extremamente importante. Quando falamos em saúde, um trabalho interdisciplinar muitas vezes é indispensável e, bem como o psicólogo e o psiquiatra intervêm sobre comportamentos e sentimentos, o nutricionista faz isso de uma forma mais indireta, porém crucial: a partir da nossa alimentação.

É esse profissional que, considerando todos esses diversos fatores, traz possibilidades de mudança pelo ato de comer, respeitando as necessidades de cada pessoa e o contexto em que está inserida. A elaboração de planos alimentares individuais é uma fração fundamental de seu trabalho, porém não é restrito a âmbito clínico. Sua atuação engloba tanto contextos educacionais, de saúde coletiva, industriais e de pesquisa, contudo, e infelizmente, poucas vezes sua figura é lembrada nessas situações.

O nutricionista, como diz a própria palavra, é alguém que nutre, sejam corpos, comportamentos, histórias, relações e, em especial, transformações. Por trás das necessidades nutricionais de um indivíduo que se alimente de determinada forma sempre haverá uma história genética, uma história de vida e uma cultura atuando sobre elas. Cabe a nós decidir se vamos continuar repetindo os modos de vida nos quais nos encontramos ou se vamos buscar meios mais saudáveis e sustentáveis de viver e, para isso, podemos contar sempre com esse alguém.

Referências:
FRANCA, C. L. et al. Contribuições da psicologia e da nutrição para a mudança do comportamento alimentar. Estudos dePsicologia (Natal), v.17, n. 2, p. 337-345, 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-294X2012000200019&lng=en&nrm=iso>. 

JACKA, F. N.; MYKLETUN, A.; BERK, M. Moving towards a population health approach to the primary prevention of common mental disorders. BMC Medicine, v. 10, n.149, p.1-6, 2012. Disponível em: 
<https://bmcmedicine.biomedcentral.com/articles/10.1186/1741-7015-10-149>

RODRIGUES, E. M.; BOOG, M. C. F. Problematização como estratégia de educação nutricional com adolescentes obesos. Caderno de Saúde Pública, v. 22, n. 5, p. 923-931,2006. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2006000500005>

TRICHES, R. M. Promoção do consumo alimentar sustentável no contexto da alimentação escolar. Trabalho, Educação e Saúde, v. 13, n. 3, p. 757-771, 2015. Disponível em: <https://www.redalyc.org/pdf/4067/406756978013.pdf>

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